Mais
uma vez o movimento das pessoas com deficiência, composto por pessoas com
deficiência, pais e estudiosos que enxergam nas Escolas Especiais, uma forma válida
de socialização de conteúdos, promovendo uma educação de qualidade como
demonstram historicamente os dados estão sendo vítimas da intolerância e da
maldade daqueles que denominamos inclusivistas, por conta da radicalidade de
seu discurso e por parecer um movimento político de interesses constituídos. Parecem
usar de alguns braços do poder público para que suas teses tenham força
argumentativa. O mais incrível é que usam o nome do Ministério Público, que em
conceito existe para defender a Lei e os direitos democráticos do cidadão de
forma imparcial e justa. No entanto, sequer as grandes entidades de defesa dos
direitos da pessoa com deficiência do Brasil, que juntas compreendem o maior
movimento social de pessoas com deficiência do mundo, foram chamadas para
debater o assunto com o Ministério Público que, declaradamente, através de alguns
dos seus membros e da Associação Nacional do Ministério Público de Defesa dos
Direitos dos Idosos e Pessoas com Deficiência (AMPID), como o Senhor Valberto
Lira, defendem um pensamento restritivo da política educacional para as pessoas
com deficiência, atitude que para o Movimento das Apaes é notoriamente ditatorial, antidemocrática e antirrepublicana,
pois não abre espaço para o diálogo.
As
entidades que defendem os direitos das pessoas com deficiência no Brasil e que
oferecem escolarização, tem uma experiência de mais de 80 anos na inclusão de
pessoas com deficiência em diversos níveis sociais e nasceram da sociedade
organizada, ou seja, de uma autêntica e legítima vontade e necessidade popular.
Ao contrário, o movimento denominado inclusivista parece afirmar deter a verdade
absoluta no que diz respeito à educação das pessoas com deficiência, não
importando o comprometimento intelectual provocado pela deficiência e mesmo sem
apresentar uma pesquisa concreta que justifique seus posicionamentos, sem ouvir
os movimentos de pessoas com deficiência constituídos, como se estes não
tivessem nada para oferecer às futuras políticas públicas e como se estes não
fossem compostos pelas próprias pessoas com deficiência, continuam afirmando
posicionamentos radicais contra as escolas especiais, com discursos falaciosos,
distorcendo a legislação para fundamentar suas afirmações. Enquanto isso os
movimentos sociais são tachados de movimentos segregadores e retrógrados. Os
movimentos sociais estão tentando, há tempos, serem ouvidos e debater a questão.
No entanto, sofrem ataques cada vez mais agressivos, como se o Movimento das
Apaes e outros movimentos sociais de luta por direitos fossem contra a inclusão
escolar da pessoa com deficiência, o que é uma inverdade.
O
Ministério da Educação, ao contrário de outros Ministérios que aceitam dialogar
com os movimentos sociais, parece tentar sobre todas as formas fundamentar a
teoria de que as entidades da sociedade civil, constituídas legalmente, que
historicamente contribuíram com a defesa dos direitos das pessoas com
deficiência, não são parceiras do Governo Federal, que são atrasadas e
segregadoras. Tentando empurrar uma política de educação especial, que está
sendo construída em conjunto com a sociedade brasileira, que se quer tem uma
política de monitoramento das ações, ficando presos somente a dados
estatísticos, como se estes magicamente, pudessem dizer algo sobre a qualidade
da aprendizagem das pessoas com deficiência nas escolas comuns. Dados e números
de alunos, não querem dizer qualidade de aprendizagem, caso contrário o Brasil
seria uma grande potência no que se refere à produção de conhecimento
científico, a exemplo de outros países de primeiro mundo.
A
respeito da nota publicada pelo promotor Valberto Lira, tentarei responder
pontualmente cada uma das questões apresentadas.
Na
Constituição Federal de 1988 a educação especial é tratada da seguinte maneira:
Art. 208 - O dever do Estado com a educação será
efetivado mediante a garantia de:
III – atendimento
educacional especializado às pessoas com deficiência, preferencialmente na rede
regular de ensino;
Redação
que foi construída pelo então Deputado Federal Nelson Seixas, que na época era
presidente da Federação Nacional das Apaes. A preocupação dele ao apresentar o
texto dessa forma, foi garantir que as pessoas com deficiência tivessem acesso às
escolas regulares da rede pública de ensino e não somente nas escolas especiais,
como era comum, na época.
No
entanto, atualmente a redação é utilizada para tentar justificar legalmente a
impossibilidade da oferta de escolarização pelas escolas especiais.
A
constituição também expõe:
Art. 205 - A educação,
direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada
com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu
preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.
Assim, é constitucional a
participação da família e da sociedade na construção da política educacional
“visando ao pleno desenvolvimento da pessoa”. Então se subentende que qualquer
política educacional apresentada, que não tenha a participação da família e da
sociedade, não é constitucional e não é legítima “a nossa carta magna”.
O termo Atendimento Educacional
Especializado ao qual a Constituição se refere, é a escolarização da pessoa com
deficiência, como demonstrado dos textos do Prof. Dr. Marcos Mazzota, que foi o
idealizador da frase. O termo sofreu uma tentativa re-conceituação pelos ditos
inclusivistas. A Política de Educação Especial na Perspectiva da Educação
Inclusiva de 2008, conceitua Atendimento Educacional Especializado como sendo um
atendimento contra turno, algumas vezes na semana, algumas horas diárias,
reduzindo o acesso da pessoa às condições adequadas e específicas para o seu
atendimento. Como se fosse simples assim. Como se as necessidades de cada
sujeito, fossem as mesmas e precisassem do mesmo tempo e o mesmo atendimento
para garantia do seu desenvolvimento saudável, necessário para melhor
aprendizagem.
Dessa forma a o texto Constitucional
prevê sim, a existência das escolas especiais, sem nenhuma divergência.
A
respeito da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência da
Organização das Nações Unidas ratificada com status Emenda Constitucional, conforme
prevê a Emenda nº 45/2004, em seu artigo 24, NÃO afirma que o único local em
que é legal fazer a escolarização da pessoa com deficiência é em uma escola
regular. A Escola Especial é uma forma de inclusão escolar e promove o
aprendizado ao longo da vida em nível de igualdade, porém igualdade é tratar as
diferenças na medida de sua diferença, não somente ser tratado como igual. Esse
é um conceito aristotélico aceito em diversas culturas de primeiro mundo,
inclusive na nossa antes do radicalismo inclusivista. Para que seja garantida à
pessoa com deficiência “a participação efetiva em uma sociedade livre” é
preciso que a sociedade seja livre, inclusive, dando condições para que os
sujeitos escolham onde querem estudar e os pais livres possam escolher onde
matricular seus filhos, conforme exposto na Declaração Universal dos Direitos
Humanos em seu Artigo XXVI:
Artigo XXVI
1.
Toda
pessoa tem direito à instrução. A instrução será gratuita, pelo menos nos graus
elementares e fundamentais. A instrução elementar será obrigatória. A instrução
técnico-profissional será acessível a todos, bem como a instrução superior,
esta baseada no mérito. 2. A instrução será orientada no sentido do pleno
desenvolvimento da personalidade humana e do fortalecimento do respeito pelos
direitos humanos e pelas liberdades fundamentais. A instrução promoverá a
compreensão, a tolerância e a amizade entre todas as nações e grupos raciais ou
religiosos, e coadjuvará as atividades das Nações Unidas em prol da manutenção
da paz. 3. Os pais têm prioridade de direito na escolha do gênero de instrução
que será ministrada a seus filhos. (Declaração Universal dos Direitos Humanos,
ONU, 1948).
Ter
um aluno em uma Escola Especial não é excluí-lo do sistema educacional sob
alegação de deficiência, mas pelo contrário é incluí-lo no sistema de educação brasileiro,
garantindo seu desenvolvimento de forma igualitária, tornando-o capaz de desenvolver
seu papel social. Desafio qualquer um tentar demonstrar o contrário, com
argumentos fundamentados na nossa atual legislação.
Sendo
assim as Escolas Especiais não estão na contramão da atual legislação
brasileira, como alega a nota apresentada.
A
nota ainda traz a falsa afirmação que a sala de aula comum é capaz de maximizar
o desenvolvimento do aluno. Gostaria enormemente que me apresentassem que
estudo foi realizado e que comprovou esta constatação ou se trata apenas de
mais uma afirmação leviana, sem nenhuma fundamentação teórica?
Relacionado aos investimentos do
Ministério da Educação nas escolas regulares do Estado Brasileiro para receber
as pessoas com deficiência, que bom que finalmente o estado resolveu investir
nesta área, pois esta foi uma luta histórica das entidades de defesa de
direitos da pessoa com deficiência, mas é importante deixar claro, que para se
investir na escola regular, não é necessário acabar com as Escolas Especiais e
se o Ministério resolveu dedicar uma política para receber os alunos com
deficiência na escola regular pública, não é por bondade do estado, mas sim por
pressão histórica dos movimentos sociais, que agora estão sendo excluídos do
processo.
Acabar com as escolas especiais ou
reduzi-las a um apoio contra turno algumas vezes por semana, é restringir o
acesso das pessoas com deficiência à educação, ao passo que mantê-las e
investir também na escola pública de qualidade para recebê-las é ampliar o
acesso a educação.
Dessa forma penso que ao invés do Ministério
da Educação ter uma política para o fechamento de escolas, ou reducionista,
reduzindo as escolas a apoio especializado, deveria estar preocupado em fazer
uma política para aumentar o acesso à escola, sem levantar bandeiras
ideológicas, que só desgastam o cenário político de defesa de direitos e
prejudicam os usuários do sistema de ensino.
Aproveito ainda este texto, para
agradecer as autoridades governamentais que tem dado espaço aos movimentos
sociais para se manifestar, flexibilizando a política pública conforme as
necessidades e demandas apresentadas pela sociedade civil organizada.
Agradecemos
à presidenta Dilma Rousseff, pelo Decreto 7611/11 e pelo reconhecimento público
do trabalho das Apaes.
Agradecemos
à Ministra Maria do Rosário, pela articulação política com outras esferas do
governo, abrindo espaço para que os movimentos sociais sejam ouvidos.
Agradecemos
a Ministra Gleisi Hoffmann, pela articulação política junto à Presidência da República.
Agradecemos
ao Deputado Federal Ângelo Vanhoni, por ter escutado os movimentos sociais de
pessoas com deficiência nos estados para elaboração de seu Relatório do Plano
Nacional de Educação.
Agradecemos
ao Deputado Federal Eduardo Barbosa, pela defesa legal dos direitos das pessoas
com deficiência e sua articulação junto a Câmara dos Deputados Federal.
Agradecemos
ao Senador Lindbergh Farias pela abertura de diálogo junto ao Governo Federal.
Agradecemos
aos Deputados Integrantes da Comissão Especial que analisou o PNE na Câmara dos
Deputados Federal, pelo apoio à Meta 4 do Plano Nacional de Educação.
Agradecemos
a tantos outros políticos e militantes da sociedade civil que estão sendo
parceiros do movimento das Apaes neste difícil momento.
Atenciosamente,
Erivaldo Fernandes Neto
Federação
Nacional das Apaes.